SENTIMENTO é a linguagem que o coração usa quando precisa mandar algum recado… (autor desconhecido).
O coração tem uma linguagem própria. Apesar de a neurociência já ter demonstrado que o cérebro é o responsável pelo processamento das informações afetivas e dos sentimentos, é fato que o ritmo do nosso coração reflete nosso estado afetivo. Não é sem razão o comentário popular de que aqueles que sofrem por amor estão com o coração apertado, não é?
São inúmeras as investigações científicas acerca do funcionamento cardíaco e sua relação com estados de humor e estados psicológicos (veja a lista de referências no final desse post). A análise dos intervalos entre os batimentos cardíacos, conhecida como variabilidade da freqüência cardíaca, permite extrair diferentes informações sobre o balanço autonômico, ou seja, o equilíbrio entre nossos sistemas de ativação (sistema nervoso simpático, conhecido como sistema de luta ou fuga) e de repouso (sistema parassimpático, conhecido como sistema de repouso e digestão). No dia a dia, em situações de repouso, há predomínio da ação parassimpática sobre o coração. Sempre que necessário, a ativação simpática desencadeia respostas fisiológicas de reação, que provocam aceleração do batimento cardíaco.
A literatura aponta que a VFC é um bom indicador do funcionamento autonômico e um importante preditor do risco de morte para pessoas que sofrem de doenças cardíacas e coronárias (Task Force 1996; Stein and Kleiger 1999; Sved 1999). Além disso, exisite certa relação entre algumas dessas variáveis e transtornos psiquiátricos (Cohen, Matar et al. 1999; Cohen, Benjamin et al. 2000; Kemp, Malhotra et al. 2003; Henry, Minassian et al. 2009; Kemp, Quintana et al. 2010). Veja abaixo o que os artigos científicos tem mostrado:
– Cohen e colaboradores (1999), em sua revisão, apontam que pessoas com esquizofrenia sob efeito de medicação, principalmente a clozapina, apresentam elevada freqüência cardíaca e baixa variabilidade da freqüência cardíaca. Acredita-se que, nesses pacientes, a diminuição da VFC esteja vinculada a uma resposta positiva às propriedades colinérgicas desse fármaco;
– Sowden e Hufman (2009) indica que, apesar de a diminuição da VFC ser considerada um fator de risco para doenças cardiovasculares, e em paciente esquizofrênicos estar associada à síndrome metabólica (ganho de peso, diabetes) – o que aumenta os fatores de risco para doenças do coração como infarto do miocárdio – as taxas de mortalidade em pacientes sem tratamento é maior do que para aqueles tratados com essa droga;
– Na pesquisa de Henry e colaboradores (2009) os pacientes internados com esquizofrenia e depressão bipolar apresentam disfunção no balanço entre os sistemas simpático e parassimpático, com indicadores de baixa VFC e reduzida atividade parassimpática (Henry, Minassian et al. 2009);
– A depressão tem sido associada à diminuição da VFC (Kemp, Quintana et al. 2010). Sowden (2009) acrescenta que os antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina são os mais indicados para pacientes depressivos com problemas cardiovasculares. Nesse caso, verificam-se indicadores de melhoras no prognóstico de infarto do miocárdio e outros eventos cardíacos.
– De um modo geral, quanto mais severos os sintomas, menor a VFC e, conseqüentemente, maiores os riscos de doenças ou episódios cardiovasculares agudos (Henry, Minassian et al. 2009; Kemp, Quintana et al. 2010).
– Em relação aos transtornos de ansiedade, a baixa VFC tem sido relacionada à hiper-ativação simpática. Esse padrão de hiper-ativação também é encontrado em pessoas com distúrbio de pânico e transtorno de estresse pós-traumático, em repouso.
Como biofeedback cardiovascular pode ajudar a melhorar os sintomas e o meu estado psicológico?
As técnicas de biofeedback são técnicas de treinamento. No caso do biofeedback cardiovascular ou VFC, sensores captam o batimento cardíaco e extraem certas variáveis (através de análises estatísticas). Através de um computador, esses sinais são mostrados de alguma forma para o usuário: sob a forma de gráficos ou associado à mídias (nesse caso a mídia funciona como um estímulo condicionado).
O processo de auto-regulação evolui de diferentes formas para cada pessoa. De um modo geral, inicialmente a pessoa trabalha para perceber suas sensações, e observa as alterações nos gráficos em função do seu estado de ativação ou relaxamento. Essa associação vai ser fortalecendo, nem sempre de modo consciente, e o usuário aprende a modular essas variáveis. O principal objetivo é aumentar a VFC. Aumentando a VFC, melhora-se o balanço autonômico, refletindo em melhoras na qualidade de vida.
Biofeedback é um método indolor, não medicamentoso, indicado para:
– distúrbios do sono;
– distúrbios de ansiedade;
– síndrome do pânico;
– depressão;
– fobias;
– asma;
– transtornos de atenção;
– problemas cardiovasculares;
– dor crônica;
– fibromialgia;
– distúrbios que afetam sistema autonômico de modo geral;
Referências:
Cohen, H., J. Benjamin, et al. (2000). “Autonomic dysregulation in panic disorder and in post-traumatic stress disorder: application of power spectrum analysis of heart rate variability at rest and in response to recollection of trauma or panic attacks.” Psychiatry Res 96(1): 1-13.
Cohen, H., M. A. Matar, et al. (1999). “Power spectral analysis of heart rate variability in psychiatry.” Psychother Psychosom 68(2): 59-66.
Henry, B. L., A. Minassian, et al. (2009). “Heart rate variability in bipolar mania and schizophrenia.” J Psychiatr Res 44(3): 168-76.
Kemp, A. H., D. S. Quintana, et al. (2010). “Impact of depression and antidepressant treatment on heart rate variability: a review and meta-analysis.” Biol Psychiatry 67(11): 1067-74.
Kemp, D. E., S. Malhotra, et al. (2003). “Heart disease and depression: don’t ignore the relationship.” Cleve Clin J Med 70(9): 745-6, 749-50, 752-4 passim.
Stein, P. K. and R. E. Kleiger (1999). “Insights from the study of heart rate variability.” Annu Rev Med 50: 249-61.
Sved, A. F. (1999). Cardiovascular System. Fundamental Neuroscience. M. J. Zigmond. San Diego, Academic Press: 1051-1061.
Task Force (1996). “Heart rate variability. Standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology.” Eur Heart J 17(3): 354-81.